Meu coração
bate rápido, meu estômago está revirando, e eu vou andando num passo meio
rápido e meio lento, entro pela porta e te descubro no meio daquela gente,
daquela gente que na verdade nem estava ali, vislumbro seu rosto, seu olhar fixo em mim. E continuo andando até que finalmente
estamos a poucos centímetros de distância, e então nos cumprimentamos com um
beijo na bochecha e de repente eu fico sem graça. Daí você me pede um abraço e
eu te dou meu abraço, claro, com o maior prazer do mundo e meio sem jeito, e
sinto seu corpo novamente, seus braços me envolvendo, tudo isso depois de tanto
tempo...
Depois, não
sei como me comportar muito bem. Tento falar coisas, coisas que soam avulsas e
sem importância, porque não sei dizer outro tipo de coisa, sabe, você me deixa
desconcertada, mas falo essas coisas pra tentar manter sua atenção em mim. E
você também parece estar falando coisas assim, e a gente estava meio
encabulado, meio constrangido, eu acho. É que passou um tempo, passaram-se
meses, diversas conversas e algumas discussões à distância e alguns juramentos
meus de que não nos veríamos novamente. Mas cá estou eu novamente, cá está você
novamente, cá estamos nós novamente. Cá estou eu mais pronta que nunca para me
entregar a você do modo mais intenso possível porque não sei fazer de outro
jeito. Cá estou eu para te sentir de novo perto de mim porque sou fraca, porque
te quis e te quero e te quero.
A gente vai
comer alguma coisa juntos e isso me deixa apreensiva porque significa que
teremos que arrumar mais papo, conversa, ou suportar um silêncio estrondoso. Estou
tímida, estou tímida, estou tímida mil vezes. E você tem lábios tão rosados e
carnudos, eu olho para eles discretamente de vez em quando e então mal posso esperar
para beijá-los outra vez, e estou tomando meu milkshake infinito e não como
nada, você me oferece algo e recuso, e isso é tudo tão estranho, sei lá, vamos
logo embora daqui, vamos logo para um lugar em que possamos nos livrar de toda
essa claridade e do seu olhar claramente penetrante sobre mim para que eu possa
extravasar o que sinto por você.
É, eu bem
queria que nós pudéssemos conversar normalmente, até acho que isso seja
possível, mas faz tanto tempo e sou tão introvertida que acabo estragando esses
poucos e raros momentos que passamos juntos. Um dia eu vou conseguir te falar
as besteiras e baboseiras e até papos cabeça que falo quando está tudo escuro à
nossa volta, você vai ver só, mas preciso de treino, só um pouco de treino.
E a escuridão
tão esperada por mim ocupa o lugar da claridade do dia lá fora quando entramos
naquela sala. Procuramos por dois assentos vazios e discretos por entre aquelas
dezenas de cabeças e vamos caminhando até a última fileira, naquele canto
esquerdo reservado para os casais de namorados. Nós nos sentamos e eu bebo um
gole de água enquanto fico progressivamente mais nervosa e mais apreensiva e
mais ansiosa e tenho o desejo crescendo dentro de mim. Você pega na minha mão e
eu estremeço. Eu não sei mais o que está acontecendo, mas sei que daqui a pouco
nós vamos nos beijar depois de tanto tempo e eu vou sentir novamente o seu
gosto e meu paladar vai ficar novamente inebriado por seu gosto, pelo toque dos
seus lábios ora suaves ora intensos e pela sua pele e pelo seu calor e pela sua
respiração e pelo seu cheiro, e então você me beija e nós nos beijamos e nós
nos beijamos e nós nos beijamos e ora minhas mãos afagam seus cabelos e ora
elas arranham sua nuca sem querer e ora nossas mãos estão juntas – e eu acho
isso tão romântico – e ora minhas mãos descem pelo seu pescoço até chegarem ao
seu peito. E você me toca tão docemente e explora meu corpo de uma forma tão
suave que não posso não consigo não quero te impedir, e seus dedos são tão
meigos adocicados calorosos encantadores aveludados. Ah, eu te quero tanto. E a
gente fica abraçado e a gente se acaricia e a gente sente o cheiro um do outro
e a gente respira um o ar do outro e isso parece tudo tão intenso que eu sei
que vou ter vontade de morrer só de lembrar. Caramba, menino, o que é isso que
há entre a gente? Eu fico tão confusa, eu não sei de nada. Mas é claro que é
tudo uma ilusão, a gente vai sair daqui e vai voltar à nossa vidinha, não é
mesmo? Sei lá, a gente vai até esquecer disso, vai ter outros casos por aí, vai
reduzir isso a nada. Mentira. Talvez você sim, mas eu não. Eu não, cara, você
mexe comigo de verdade.